Eu não saberia precisar quando foi que eu percebi que existiam cores de peles diferentes. Eu nem sequer saberia dizer quando foi a primeira vez que isso me incomodou. Mas posso garantir, me incomodou muito.
Foi na adolescência que eu percebi nitidamente como a seleção do certo e do errado, do bom e do ruim e do branco e do preto era feita. Pessoas, que até então eram boas e generosas a meu ver, de uma hora para a outra começaram a dar palpites na cor dos meninos que eu não deveria namorar. Amigos que não se misturavam muito com aqueles “neguinhos” da escola ficavam cada vez mais distantes. Professores que deveriam exercer papel fundamental para se esclarecer tamanho disparate, não se mostravam comprometidos com o assunto. E foi só no cursinho, num colégio particular, que um professor de geografia me chamou atenção para o uso da conjunção “mas” em algumas frases do tipo:
“Tá vendo aquele pretinho ali? Aquele bem preto mesmo?”
“Sei”
“Então, ele é preto assim, mas é muito bonzinho. Precisa ver que menino generoso.”
E eu, no auge da minha descoberta da Língua Portuguesa fiquei sem entender o que o “mas” tinha a ver com tudo isso. É como se sua função fosse demarcar o contraste dessa sentença. “Como alguém pode ser preto e bonzinho?”
Mas minha dúvida não parava por aí, não. Preto? Eu reparei que ninguém era bem preto, nem bem branco. Que não existiam pessoas bem vermelhas, assim como não existiam os amarelos. Eu reparei que as nuances das cores de cada ser humano, individualmente eram muito mais sofisticadas do que nossa capacidade intelectual poderia atingir. Eu compreendi também que todas aquelas piadinhas, que já tinham me feito rir tanto, acabara de perder completamente a graça. Eu me vi do lado de cá da raça. Eu, uma menina de 16 anos, branca, paulista, começava (e era só o começo mesmo) mensurar o tamanho do problema de daltonismo que afligia o nosso país. E acho que eu não poderia encontrar definição melhor para toda essa celeuma em torno dos negros. Vocês sabiam que o Daltonismo pode ter origem genética? (E não é assim que o preconceito se forma?) Mas também pode ser resultado de uma lesão visual ou neurológica. (E também não é daí, da mente humana, que nasce o racismo?)
Pois bem, após essa iniciação entre os signos sagrados da hipócrita sociedade brasileira, aos 19 anos me mudei para Toronto, Canadá. E mesmo que todos esses conceitos raciais não fossem presentes na minha vida todo instante, eu não podia deixar de reparar como os negros canadenses eram diferentes dos nossos. Eles são belos e se comportam como belos, como inteligentes, como iguais. Eu presenciei várias meninas negras, andando de nariz empinado perto de uma norte-americanazinha branca. Via os meninos negros, jogando basquete, no ápice de seus corpos volumosos, suados e, negros sim por que não?
Eu não posso falar com inteira propriedade do que é ser negro no Canadá, mas o que pude perceber é que não é nada de tão diferente do que ser branco. Pelo menos para os adolescentes, claro. Eles agem naturalmente. Se sentem e se vêem tão ou mais capazes do que qualquer outra pessoa, independente da cor de sua pele. Eu pensava, por que não pode ser assim no Brasil também?
Passado algum tempo, volto ao Brasil e decido morar em Salvador. Era um velho sonho. Tudo o que tinha a ver com a Bahia me encantava, desde bem pequenininha. Meu desejo maior era enfim saber que gosto tinha o acarajé. E foi aí que minhas percepções de raça, de etnia, de cor se definiam de vez.
Eu trouxe comigo uma bagagem grande de pré-conceitos de São Paulo. Conceitos esses que se transformaram de certa forma no Canadá, até por se tratar de um país onde a identidade pura canadense é muito difícil de achar, por questões de colonização, imigração e tudo o mais. E agora era dada a mim uma oportunidade, talvez única, de entender melhor como o racismo chega aos negros. Era minha vez de estar do outro lado e poder acabar com o conceito, por exemplo, que ser ou estar baiano é sinônimo de ser ou estar mal vestido, cafona, fora de moda, com combinações de cores bizarras. Foi assim que eu conheci, de fato, a identidade negra, no berço negro do nosso país. Foi onde eu vi a real beleza desse povo que também sou eu, que também é minha família. Entendi que todo esse bate-papo em volta da predileção de uma ração em detrimento à outra é pura perda de tempo. Nós somos todos, parte de uma nação única e plural. Que cada um tem sua origem num canto distinto do Mundo. Que enquanto meus pais e avós vêm da Itália, a família do meu marido vem da África. E que agora nosso filho não vem nem da África nem da Itália, mas sim do Brasil que abriga toda a Europa, Ásia, Oceania, África e Américas e faz desse novo cidadão, alguém multicultural, com sangue puramente vermelho, porque essa é a cor natural do sangue. Um cidadão com a pele de cor única, a dele. Pois ele não é nem mais negro nem mais branco que seus pais. Ele é ele. E não tem obrigação de ser mais nada além disso.
terça-feira, 6 de julho de 2010
domingo, 4 de julho de 2010
Como Tudo Começou (Desde o Início)
Eu já passei bastante da hora de muitas coisas.
No auge dos meus 30 anos,
já deixei passar várias coisas sem concluir,
sem nem ao menos começar.
Por exemplo, vocês acham que passei da segunda aula de Francês?
Não.
E o balé?
Cheguei ao fim da primeira apresentação e só!
E o teclado?
Com esse nem cheguei a me apresentar.
Amarelei!
E o Espanhol?
Deus me livre. Não posso nem ver na frente.
Isso sem falar em todas as coisas que nem sairam da minha cabeça.
A natação, a dança de salão, o carrinho de churros, a poupança para aquela viagem...
Enfim, hoje tudo isso parece muito distante de mim.
E o que será que sobrou?
Terá sobrado alguma coisa de tantas ideias e tão poucos resultados?
Se todas essas constatações fazem parte de mim,
então seria eu um ser inacabado?
Um eu tão sem finalizações?
Seria por conta disso, talvez, tanta insônia?
Tanta angustia? Tanto desespero?
Se eu sou o que faço, então eu não sou nada?
Devo então me acabar por entre os remendos e os destroços de tudo o que não cheguei a construir.
E será que um dia construirei algo grandioso?
Será que eu sou mesmo dona daquela estrela que em meus sonhos brilha, me ilude e alimenta?
Será que eu serei sempre um 'será'?
Um 'se' sem mais nem menos?
Um eterno ponto de interrogação
???
Eu não sei.
Mais uma vez, sem resposta.
E parece que hoje, digo algo que faz sentido, algo mais modificador.
Mas parece (de novo, parece) que não tenho plateia.
Não tenho ouvintes.
E se viver 'parecendo', vou acabar sendo aquela que não é o que é,
ou que parece ser, mas examinando melhor, nem chega a ser alguma coisa.
E pra terminar...
Nem sei como terminar.
Tem sido assim, aliás.
Não sei onde colocar o ponto final.
Não sei qual palavra escolher.
O melhor deve ser, talvez, o repentino...
...
...
...
Silêncio.
FIM!
No auge dos meus 30 anos,
já deixei passar várias coisas sem concluir,
sem nem ao menos começar.
Por exemplo, vocês acham que passei da segunda aula de Francês?
Não.
E o balé?
Cheguei ao fim da primeira apresentação e só!
E o teclado?
Com esse nem cheguei a me apresentar.
Amarelei!
E o Espanhol?
Deus me livre. Não posso nem ver na frente.
Isso sem falar em todas as coisas que nem sairam da minha cabeça.
A natação, a dança de salão, o carrinho de churros, a poupança para aquela viagem...
Enfim, hoje tudo isso parece muito distante de mim.
E o que será que sobrou?
Terá sobrado alguma coisa de tantas ideias e tão poucos resultados?
Se todas essas constatações fazem parte de mim,
então seria eu um ser inacabado?
Um eu tão sem finalizações?
Seria por conta disso, talvez, tanta insônia?
Tanta angustia? Tanto desespero?
Se eu sou o que faço, então eu não sou nada?
Devo então me acabar por entre os remendos e os destroços de tudo o que não cheguei a construir.
E será que um dia construirei algo grandioso?
Será que eu sou mesmo dona daquela estrela que em meus sonhos brilha, me ilude e alimenta?
Será que eu serei sempre um 'será'?
Um 'se' sem mais nem menos?
Um eterno ponto de interrogação
???
Eu não sei.
Mais uma vez, sem resposta.
E parece que hoje, digo algo que faz sentido, algo mais modificador.
Mas parece (de novo, parece) que não tenho plateia.
Não tenho ouvintes.
E se viver 'parecendo', vou acabar sendo aquela que não é o que é,
ou que parece ser, mas examinando melhor, nem chega a ser alguma coisa.
E pra terminar...
Nem sei como terminar.
Tem sido assim, aliás.
Não sei onde colocar o ponto final.
Não sei qual palavra escolher.
O melhor deve ser, talvez, o repentino...
...
...
...
Silêncio.
FIM!
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